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Pelican Bay e as fomes psicológicas.


Pessoa presa numa cela.

A Penitenciária Estadual de Pelican Bay, considerada a mais rigorosa instituição penal do Estado da Califórnia, pertence a uma nova geração de prisões de segurança máxima, denominada nos Estados Unidos de Supermax.

Outra característica da Pelican Bay (Pelican Bay´s Security Housing Unit– SHU) é a presença de confinamento solitário prolongado em adultos, objeto de reflexão deste artigo a luz de uma nova teoria em psicologia- A Análise Transacional- AT.

Craig Haney, um renomado psicólogo e pesquisador americano que estudou os efeitos nocivos do confinamento prolongado, é autor de um trabalho realizado com um grupo de detentos em 1993 na Penitenciária Estadual de Pelican Bay, onde o guru e satânico assassino de Sharon Tate, Charles Manson, mais parecido com Rasputin, esteve confinado. Vinte anos mais tarde, Craig voltou a esta mesma instituição penal para efetuar novas entrevistas a fim de subsidiar dados para uma ação judicial contra o isolamento prolongado de detentos de Pelican Bay.

Haney revelou ter observado vários prisioneiros que houvera encontrado em sua primeira visita vivendo na mesma cela hermética de sete metros quadrados, construída em concreto, sem janelas, com portas que se abrem e se fecham eletronicamente, com a mesma vida solitária e longe do contato humano, inclusive com os guardas e outros prisioneiros. Muitos deles não recebiam visitas, e para alguns não era permitido contato humano presencial ou telefônico. Haney revelou que foi chocante rever esta cena em instituição prisional ainda em nossos dias, condição que ele denominou de Morte Social.

Os prisioneiros revelaram a Haney também que eles lutavam diariamente para manter a sanidade e o desejo de ver uma árvore, um pássaro ou um ser humano para conversar.

Estranhamente, diz um artigo do New York Times, “depois de algum tempo de confinamento, muitos deles rejeitavam as escassas oportunidades de contato a que

tinham direito. É como um pássaro que não sai de sua gaiola para não sucumbir a morte, revelou um prisioneiro”.

Em Julho de 2015 Barack Obama, o primeiro presidente americano a visitar uma prisão federal questionou: “será que realmente faz sentido trancar tanta gente sozinha em celas minúsculas durante 23 horas por dia, por meses ou anos a fio”?

Hoje 75.000 detentos estão nesta condição social e psicológica em prisões americanas.

Remetendo-nos aos trabalhos sobre as seis fomes psicológicas, descritas inicialmente em Sex in human loving pelo psiquiatra Eric Berne, o criador da Análise Transacional relatou: “Foi uma grande surpresa quando este fato (confinamento prolongado) pela primeira vez veio à luz durante os julgamentos Trotskistas na Rússia da década de trinta. A maioria das pessoas pensava que os Trotskistas “confessavam” seus crimes induzidos por terríveis torturas e prestando falsos testemunhos” (Berne 1970).

Todavia, o segredo da confissão era outro: Os prisioneiros eram mantidos em uma cela em condição de total monotonia tal como ter uma luz acesa dia e noite, o mesmo alimento sendo servido a mesma hora e na mesma tigela. E mais, o prisioneiro não podia ver quem o servia em face de seu total confinamento. Sem tocar ou ser tocado dia após dia, mês após mês e anos após anos por tempo tão prolongado quanto possível isto era a chave para que o prisioneiro revelasse os crimes cometidos durante a revolução Trotskista.

Enfim, esta condição psicológica levava a um colapso do sistema nervoso do prisioneiro por falta de estimulação sensorial através dos órgãos dos sentidos, como o contato pele com pele ou o que chamamos de carinho, reconhecimento com atos e palavras mesmo sendo negativo, a falta de tarefa para preencher o tempo e outras relações sociais que geram reconhecimento ou alguma ação positiva, preenchida com ações como trabalho, hobbies, passatempos e trocas afetivas.

Os Estados Unidos têm a maior população carcerária do mundo seguida pelo Brasil e solitárias como as de Pelican Bay são estruturadas para certos tipos de crimes.

Fazendo um paralelo entre as condições prisionais americanas e brasileiras, tendo em vista a crise que estamos vivendo, o prisioneiro de Pelican Bay fica condicionado a perder completamente sua identidade sendo capaz de revelar tudo por quase nada.

A crise no sistema carcerário brasileiro como temos visto, mostra a completa degradação em nosso sistema prisional, albergando muitas vezes o triplo de sua capacidade, sua população vive em espaços restritos, promíscuos e sem possibilidade de recuperação.

Em nosso sistema prisional o indivíduo se identifica com líderes criminosos ligados ao tráfico de drogas e ao crime organizado em seus múltiplos vieses envolvendo-se com grupos como o PCC e CV dentro e fora do próprio sistema carcerário, impulsionado pelas fomes (necessidades) de pertencer, ser reconhecido, ter contato, estímulo e construindo incidentes (rebeliões).


Consulta bibliográfica:

Berne, Eric. Sex in human loving. City National Bank, Beverly Hills, Cal. USA, 1970.

Diário Folha de São Paulo SP. Ciência e tecnologia. 15 de Agosto de 2015. São Paulo- SP

Haney, Craig. Mental Health Issues in Long-Term Solitary and Supermax Confinement, Crime and Delinquency.Vol49 no. 1, 124-156, Jan 2003.


Manoel de Maria Texeira

Médico psiquiatra do núcleo de Saúde Mental da ESFda Clinicassi Centro, São Paulo SP

e-mail: manoel.t@terra.com.br

Tel. (11) 5574-7147



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